sexta-feira, 14 de maio de 2010

Sofrimentos do jovem Deus

Deus estava sentado, relaxado, no meio fio, com os cotovelos escorados em seus joelhos e batendo palmas praquele espetáculo à sua frente. Nada de anormal acontecia a não ser o vai e vem dos carros, que pareciam descontrolados mas que naverdade obedeciam ao sinal. Verde, vermelho, amarelo, não conseguia distinguir a ordem e isso não alterava em nada o que ele via. Os carros continuavam passando como sestivessem procurando a cura pra morte ou pra vida, quem é que sabe? E Deus lá... perdido em seus pensamentos e lembranças. E no que ele pensava estava furiosamente o fazendo lembrar de tudo. Tudo o que tinha acontecido praqueele estivesse ali naquele momento. Que tristeza olhar aquele pobre rapaz de olhos enegrecidos por fantasmas que tentava em vão afastar com suas palmas. Os cabelos desgrenhados pelo vento forte que soprava pela manhã fazia com que sua figura se tornasse cadavez mais peculiar. A um tempo solitário e triste e em outros momentos olhá-lo era como observar a natureza pela beleza que se mostra. Ele lá, sentado, batendo suas palmas, olhando através dos carros. A essa altura já achava que ele nãoqueria sair daquela posição. Do jeito que estava poderia ficar mais um século e meio. 

Mas nem sempre estivera ali, apenas aos observadores atentos e madrugadores. Aqueles que se levantam cedo prair ao trabalho conseguiram ver o momento exato em que Deus chegou, olhou, sentou e começou sua claque a seu espetáculo imaginoso e fantástico. 

Antes de sedecidir por aquele lugar ele já havia passado por vários outros indecisamente. Acho que naverdade não fazia a menor diferença esse ou aquele lugar, já que ele parecia não estar em lugar algum. Então tanto fazia a escolha. Não havia problema porque seria sua última decisão a ser tomada. 

Ele que tinha descoberto sem querer que não era humano e que tudo aquilo que via no espelho não passava da casca transitória de um inseto qualquer. Tudo tão derrepente que não conseguiu digerir de forma natural a notícia, apesar de sentir todos os sinais de sua diferença durante toda sua vida. Mas que vida toda foi essa que ele pode ter vivido, já que não aparentater mais do que quinze ou dezesseis anos? Mas ossegredo de sua identidade havia vazado, seus pais não conseguiram guardar a verdade por muito tempo e ele abismado e muito assustado com aquilo resolveu fugir desnorteado como uma bússula quebrada.

O que ele provavelmente ainda não sabia era que o único humano em todo mundo era ele mesmo. O resto de nós éramos todos qualquer coisa, e nesse caso não posso dizer que éramos insetos, ou macacos, ou atémesmo leões. Ele havia caído do céu e estava conosco há muito tempo, mais do que ele poderia imaginar, apesar de aparentar ser apenas um adolescente. Tudo o que construímos, inventamos, criamos, descobrimos foi por causa da sua presença inspiradora. Mas ele não sabe disso e ninguém entre nós sabe porque ele esqueceu e agora está ali sentado como um doente batendo palmas pra um espetáculo que não existe. 

Talvez exista mesmo... talvez ele esteja batendo palmas pratudo aquilo que ele nos fez criar e que agora, tendo esquecido, acha belo e perfeito. Mas a confusão em sua cabeça é crescente e nunca mais será o mesmo depois de hoje. Ontem já não existe mais porque definitivamente sua morte nos presenteou com uma realidade alegre demais pra ser esquecida. A confusão que se fez foi creditada à ele mesmo, que nos encheu com seus milagres a ponto de termos em nossas mão tanto poder quanto ele. E nos utilizamos disso pra inverter as posições. Ele não evoluiu, quis permanecer criança. Deus nunca mais vai se levantar daquele meiofio. Jamais teremos sua importante presença entre nós. E também não queremos que isso aconteça jáque, nós humanos ou humanóides, não queremos voltar a ser subordinado a uma criatura tão frágil quanto ele.

Tudo ia muito bem, porém, num acesso de fúria juvenil, Deus se levantou com os olhos injetados como os de um viciado e começou a gritar coisas incompreensíveis a nós. Masele sabia o que estava gritando. Era uma espécie de prece, reza ou oração. E fazia isso de maneira tão estranha que derrepente tudo parou ao seu redor. As pessoas ficaram todas paradas e se voltaram pra ele, queriam ver a loucura em pessoa saindo da boca daquele jovem. Os carros também pararam todos, as luzes do sinal também se apagaram, e ovento também obedeceu a essa ordem dada não sei por quem, talvez por Deus. As folhas das árvores pararam de cair. Os insetos também silenciaram suas pernas e asas para contemplar a loucura juvenil disfarçada de sabedoria.

O sol também parou e em silêncio luminoso presenciou os terríveis e maravilhosos eventos que se sucederam. Eu, humilde narrador desses fatos, quase não tive voz ou dedos para descrever aquilo tudo que vi. Deus havia parado de gritar aquelas sonâmbulas palavras e nesse momento fazia gestos longos e suaves com os braços. Levantava como se fosse fazer alongamento e em seguida apontava-os para o horizonte, como a mostrar a paisagem. Parecia que estava regendo uma orquestra imaginária e a música que saía era a melodia dos desastres e tragédias. Todas as nuvens negras do universo se movimentaram ao seu comando e despejaram sobre o corrupto planeta grandes descargas de energia e a cada uma dessas descargas uma dezena de vidas era interrompidas tão instantaneamente quanto o próprio evento elétrico. Os carros ficaram suspensos no ar, comtodos seus motoristas e ocupantes, e simplesmente desapareceram com o simples balançar o dedo indicador de Deus.

Ele agora tinha uma aparência poderosa. Seus olhos já não eram aqueles do começo dessa história. Os seus tenros anos já haviam desaparecido e ele parecia ter bem mais de cem anos de tristezas e frustrações. Isso estava escrito na decepção estampada nos gestos quefazia. Era uma vingança aquilo e ele estava executando com prazer. Estava se deliciando com o final infeliz daquelas felizes criaturas. Sem explicação e sem defesa, nenhum ou ninguém se defendeu. Tudo foi tão derrepente que não houve tempo. 

Quando tudo estava acabado e não havia mais ninguém e sobre a face da terra ele sorriu. Ele emitiu uma gargalhada tão feliz quanto ao mais inocente riso de criança. Não tinha mais volta e ele finalmente estava sozinho e tinha se vingado de tudo. Não havia mais família, nem mentira, nem falsidade, e nem milagres. Deus era o milagre. A causa eo efeito de tudo o que existia e que agora não passava depó. O vento nunca mais iria soprar desse lado do universo. O homem, ser humano tão racional, havia decidido por fim em sua trajetória. E Deus como resultado da invenção humana havia também cumprido seu papel. Terrível, mas maravilhosamente bom.

Eu vago agora por ai como um condenado pelo meus atos e sempre me lembro dos tormentos que passei naquele dia. Todos os pesadelos que tenho me dão o direito de me arrepender de todos eles. Fiz o que fiz porque estava cansado de tudo e nada mais me interessava. O que me resta e vagar por todas essas estrelas pedindo por abrigo. Uma acolhida menos dolorosa doque aquela que tive na terra. Mas nem sempre sou bem recebido, já todos sabem o que fiz com aquilo que fizeram de mim e minha reputação chega antes da minha decisão de ir. Não nego nada das coisas que fiz e dos crimes que cometi e meus irmão tem todo o direito de me incriminar. Soumais livre agora e me compreendo melhor porque sei que não existe em lugar nenhum do universo um lugar com gente tão complicada quanto aquele. E sei também que jamais haverá novamente um outro lugar para abrigar gente tão mesquinha. Então vago por aí. Vou de sol em sol, as vezes apareço em alguma lua ou atémesmo nos anéis de saturno, de onde já fui expulso várias vezes, mas eu entendo, afinal quem quer um destruidor entre os seus. Um ser terrível como eu tem que ficar isolado mesmo e entender que é um dejeto do universo. 

Já pensei em me suicidar, acabar com minha insignificante vida talvez seja o mais sensato a fazer, mas não encontro uma maneira. Já até tentei um buraco negro e mergulhei de cabeça. Fiquei decepcionado quando me vi virado do avesso ao invés de morto, extinto, acabado. O outro lado foi frustrante, até porque o universo lá é espelho desse daqui. Então decidi voltar a ser o que era aqui. Melhor ou pior, sei lá, o fato é que não vou conseguir me livrar de mimmesmo. Isso está ficando cada vez pior. Minha última tentativa foi chocar-me contra um sol qualquer, de preferência o maior, me incendiar, fazer cinzas do meu corpo e de todos os meus malditos pensamentos. Mas também não consegui, porque o fogo realimentou todos os meus ódios e ressuscitou o meu desejo de vingança. Me vingar de todos e de mim mesmo. Da minha vida surreal e dos objetivos que desconheço pra viver. Fiquei pior, ou melhor, do que antes após a tentativa frustrada contra os sóis. 

Acabei aceitando passiva e pacificamente que não posso morrer. Sou mesmo imortal e a eternidade é um fardo muito pesado pra eu carregar sozinho. Não estou conseguindo e não consigo ninguém pra me ajudar. Alguém com quem eu possa compartilhar meus sofrimentos. A imortalidade realmente é a única coisa que passou a me incomodar mais do que todos os humanos que assassinei de propósito. Às vezes penso que seria melhor que eu também tivesse morrido naquele dia aos dezesseis anos de idade. Muito melhor do passar vivo eternamente olhando o tempo passar e nunca poder me agarrar a ele. Ficar sempre esperando a morte que nunca vem e nunca virá. Meu castigo é esse, viverpra vermorrer todas as outras criaturas e amargar minha inveja e minha dor.
Minha impotência diante da morte é a declaração que posso viver por todos os tempos desejando a morte que nunca irei alcançar.

Eu também aceito isso. Agora, nesse momento olhando prasestrelas vejo tudo o que me interessa. Não existe mais ninguém como eu em lugar nenhum. Sou único e por isso a solidão que sinto talvez esteja me corroendo e me fazendo desejar ser cada vez mais solitário.

Já me decidi. Amanhã bem cedo vou caçar, melhor, vou me divertir com o que sobrou de vida no universo. Vou ter tudo nas minhas mãos e decidirei o que é melhor afazer. Mas sei o que vou fazer. Vou acabar com tudo, destruirei todos os resquícios de vida existente. Não deixarei um planeta no lugar. Não haverá um sol aceso em nenhuma parte do universo e também apagarei todas as estrelas. Nunca mais haverá luz. E na escuridão concluirei minha tarefa. Apagarei todas as vidas e suas possibilidades para finalmente estar em minha própria companhia. Pra sempre comigomesmo é o meu destino e o aceito de bom grado. Fui fabricado e inventado por seres que não sabiam o que estavam fazendo e agora assumo minha posição de criador de tudo, e como tal, detentor do direito de destruir tudo e qualquer coisa que me leve a pensar que um dia existiu vida em algum espaço ou tempo.

Obs: Deixei umas palavras juntas de propósito, é só um experimentalismo.

quarta-feira, 12 de maio de 2010

Felicidade


Eu sou feliz. Alguém aí duvida? Sou muito feliz naquilo que sou. Extremamente feliz com aquilo que faço. Alguém duvida? E sabe por que eu sou feliz? Simplesmente porque não estou nenhum pouco preocupado com os sofrimentos alheios. Porque eu não ligo a mínima se a função que desempenho está totalmente desvinculada do todo. Porque acredito que eu faço o melhor que posso. Porque penso que faço minha parte. E a minha parte estando cumprida, não me interessam se os outros fazem as deles. Nem ligo pra essa bobagem, afinal sou muito competente. Exerço minha cidadania ficando calado e escondendo nas cômodas sombras da covardia. Disfarço muito bem esse meu fraco, já que não posso deixar aparecer nenhuma linha solta. Minha felicidade está acima de tudo, de todos e de qualquer coisa. Ninguém pode me dizer que está descontente que rapidamente o faço lembrar que a vida é bela e curta demais pra ser vivida descontentemente. O segredo da felicidade está exatamente na capacidade de não enxergar os problemas. E isso eu faço com maestria. Não enxergo nada que possa me trazer pra realidade. Não vejo a corrupção que assola nosso país. Não vejo a violência que nos mantêm presos em nossas próprias casas. Não vejo a enorme quantidade de dinheiro público sendo desviado para o bolso de políticos inescrupulosos. Não vejo e jamais quero ver o sistema educacional brasileiro cada vez mais falido e com seus objetivos seriamente comprometidos. Não enxergo o caos da saúde pública. Nem olho pros mandos e desmandos dos nossos representantes. Mas também não quero nem ver todas as outras pequenas desgraças do dia-a-dia. Aquelas que se tornaram tão corriqueiras que já nem percebemos que elas existem. Eu não posso ver essas coisas pra não atrapalhar minha felicidade. Alguns dos leitores dessa ode à felicidade podem me achar egoísta, mas garanto que esse não é o caso. Tenho certeza que ser feliz, do jeito que sou, é a solução pra todos os problemas do mundo. Todo mundo tem que aceitar que a felicidade só existe se entendermos nosso papel no mundo. E qual é esse papel? Fácil. Aceitar ficar calado. Permanecer de olhos fechados. Jamais questionar. Essa é a receita da minha felicidade. Aprenderam? Tenho certeza que sim, afinal vocês são pessoas inteligentes e compreendem perfeitamente que o melhor a fazer é ficar alheio aos problemas, pra que a felicidade possa enfim reinar entre os homens e mulheres de boa vontade....

quinta-feira, 6 de maio de 2010

Ei você, covarde!!



Não fuja dos seus reflexos. Não pense que isso poderá te isentar de todas as culpas. Não pense que você é esperto. Não haja dissimuladamente como se sua covardia fosse um ato de coragem. Deixe de ingerir doses homeopáticas de medo. Você mesmo, é com você que eu estou falando. Tenha opinião. Construa suas verdades, relativas, mas suas. Queira querer ter iniciativa. Não haja feito um bebê chorão. Não sinta pena de você mesmo. Não tente racionalizar, dizendo pra você mesmo que não ia adiantar você participar. Participe mais. Fale mais. Se esconda menos. Sonhe. Ouse um dia ter um sonho utópico. Pare de espalhar por aí que tudo é assim mesmo. Não seja mesquinho, medíocre, pequeno e infeliz. A sua covardia ainda vai te matar meu amigo. Suas nunca pronunciadas opiniões ainda vão te sufocar. E daí, como vai ser? Do que adiantou todo esse medo de se envolver com os problemas que fizeram parte de sua vida? De nada adiantou, não é mesmo? Continue assim e você nunca sentira o gosto da liberdade real. Siga por esse caminho e você jamais conhecerá o sabor de ter tentado. Queira sempre fugir e você vai morrer sem apreciar a bela paisagem do enfrentamento sincero. Corra de todos os problemas alheios e, pode ter certeza, a vida não terá pena de cobrar suas culpas. O determinismo é uma praga e a covardia seu filho único. As outras desgraças humanas são todas seus descendentes.