sexta-feira, 25 de abril de 2008

Assim, amém

Tudo é assim como qualquer outra coisa. Assim estamos parados como pedras. Assim esperamos que as coisas aconteçam. Assim ouvimos tudo aquilo que gostaríamos de dizer. Assim falamos tudo aquilo que devíamos calar. Assim somos muito mais do que na realidade. Assim realizamos todos os sonhos de outrem.

Assim rejeitamos nossos próprios sonhos, pois contradizem nossos conceitos, equivocados, a respeito da verdade. Assim, verdadeiramente, nos preocupamos com as aves, pois não sabemos como vivem. Assim questionamos sua liberdade. Assim escravizamo-nos dia após dia, insensivelmente. Assim, nós humanos, nos tornamos humanamente animalescos. Assim continuamos, prepotentemente, no caminho exato. Assim como a certeza de estarmos certos.

Assim como a pureza que nos é negada. Assim como a negação dos sentimentos sentidos e ressentidos. Assim como as sensações que nos são estranhas. Assim como a estranheza que causa as dores. Assim como as dores que revelam as provas. Assim como as provas de nossas experiências. Assim como as experiências dos reencontros.

Assim e somente assim perpetuamos nossa medíocre existência. Assim como animais que mecanicamente nascem, se reproduzem e morrem. Assim como seres feitos de chuva, vento e barro. Assim como folhas que caem, morrem, pra depois voltarem a serem folhas. Assim pela eternidade morremos. Assim eternamente mortos vivemos como se estivéssemos alcançado a plenitude. Assim, plenamente, estamos sempre parados num ponto qualquer, entre a morte e o ser.

Por assim ser, não somos. Se assim fossemos, talvez pudéssemos voltar a não ser. Quando assim pudermos viver, sem ser, já não haverá humanidade. Humanos assim vivendo. Assim e pra todo sempre assim.

Ontem foi assim. Hoje é assim. Amanhã também será assim. Assim não há chances de mudanças. Pois assim não queremos mudar. Mais do que assim, queremos repetir as lições de ontem. Para assim continuarmos iguais amanhã. Assim não se importando ou se importando com nada.
Assim nada pode nos interromper. Assim como cometas em suas órbitas. Mesmo assim, sem sentido. Assim e sempre assim. Amém.

SILVA, Edmilson R. Textos Sobre Assuntos Aleatórios, Mas Sem Importância Alguma. Edição Única. Kaloré: Liberdade, 2008.

Nenhum comentário: